A caçada ocorreu em enormes instalações enterradas em grandes profundidades, onde
milhares de olhos artificiais aguardavam o momento certo de revelar os segredos
dos neutrinos. Em 1998, Takaaki Kajita apresentou a descoberta de que os
neutrinos parecem sofrer metamorfose: eles mudam de identidade no caminho até o
detector Super-Kamiokande, no Japão. Os neutrinos capturados lá são criados em
reações entre raios cósmicos e a atmosfera da Terra. Enquanto isso, no
outro lado do planeta, cientistas do Sudbury Neutrino Observatory (SNO), no
Canadá, estavam estudando neutrinos vindos do Sol. Em 2001, o grupo de pesquisa
liderado por Arthur B. McDonald também provou que esses neutrinos mudam de
identidade.
Juntos, os dois experimentos descobriram um novo fenômeno: as oscilações dos neutrinos. Uma conclusão dos experimentos é que o neutrino, por muito tempo considerado sem massa, na verdade, tem que possuir massa. Isto é de uma extraordinária importância para a física de partículas e para o nosso entendimento do universo.
![]() |
Interior do Super-Kamiokande. [Imagem: Universidade de Tóquio] |
Nós vivemos em um
mundo de neutrinos. Trilhões de neutrinos atravessam seu corpo a cada segundo.
Você não pode vê-los nem senti-los. Os neutrinos viajam através do espaço quase
à velocidade da luz e quase não interagem com a matéria. De onde eles vêm?
Muitos foram
criados já no início do universo. Outros tantos são constantemente criados em
vários processos no espaço e na Terra — de explosões de supernovas a reações
nucleares em usinas e decaimentos radioativos que ocorrem naturalmente. Mesmo
dentro de nossos corpos, uma média de 5000 neutrinos por segundo é liberada
quando um isótopo de potássio decai. A maioria dos neutrinos que atinge a Terra
se origina em reações nucleares no interior do Sol. Depois das partículas de
luz (os fótons), os neutrinos são as partículas mais numerosas do universo.
A existência dos
neutrinos, proposta pelo austríaco Wolfgang Pauli (Prêmio Nobel em 1945), foi,
sobretudo, uma tentativa desesperada para explicar a conservação de energia no
decaimento beta, um tipo de
decaimento radioativo no núcleo atômico. Em dezembro de 1930, Pauli escreveu
uma carta para seus colegas físicos, sugerindo que parte da energia era
carregada por uma partícula eletricamente neutra, fracamente interagente e
muito leve. Ele quase não acreditava na existência dessa partícula.
Supostamente ele disse: "Eu fiz uma coisa terrível: postulei uma partícula
que não pode ser detectada".
Essa partícula
extra proposta por Pauli, que parecia um simples artifício, foi inicialmente
encarada com ceticismo pela comunidade científica. Porém, o italiano Enrico
Fermi (Prêmio Nobel em 1938) a levou a sério. E, em 1932, atribuiu-lhe o nome
de neutrino, que significa "pequeno nêutron" em italiano. O
brasileiro Mário Schenberg (1914-1990), que trabalhou com Fermi, foi um dos
primeiros a utilizar operacionalmente tal ideia, por meio da qual fechou o
balanço energético da explosão das supernovas.
Ainda levaria mais
de 20 anos para que o neutrino fosse realmente descoberto. A oportunidade veio
na década de 1950, quando os neutrinos começam a jorrar em grande quantidade
nas usinas nucleares que estavam entrando em operação. Em junho de 1956, dois
físicos estadunidenses, Frederick Reines (Prêmio Nobel em 1995) e Clyde Cowan
enviaram um telegrama para Wolfgang Pauli, mencionando que os neutrinos haviam
deixado traços nos seus detectores.
O Nobel de Física
deste ano premia uma descoberta que resolveu um enigma de longa data sobre os
neutrinos. Desde a década de 1960, cientistas tinham determinado, teoricamente,
o número de neutrinos que foram criados nas reações nucleares que fazem o Sol
brilhar, mas, ao realizarem medidas na Terra, verificou-se que cerca de 2/3 da
quantidade calculada estava faltando. Para onde foram os neutrinos?